ESTRATIFICAÇÃO E DESIGUALDADES SOCIAIS
Ao longo da história dividimos e classificamos os grupos e indivíduos em escalas.
ENTENDENDO OS CONCEITOS
De acordo com o tempo e o espaço, as estruturas sociais assumiram formas e denominações específicas. Mas o que é estrutura social? Estrutura social é a forma através da qual uma sociedade está organizada nos seus aspectos econômicos, políticos, sociais, culturais e históricos.
As sociedades ao longo dos seus processos históricos estabelecem divisões. A maneira através da qual uma sociedade está dividida em camadas ou estratos sociais tem o nome de estratificação social. O estudo das sociedades passa por entender e localizar os indivíduos em cada estrato social. É fundamental destacar ainda que, via de regra, essa divisão em camadas gera um cenário de hierarquia social, isto é, dependendo da posição do indivíduo em cada estrato ele terá um maior ou menor acesso a recursos, direitos, oportunidades e poder. Portanto, a estratificação social pautada numa lógica hierárquica tem como consequência a desigualdade social.
Por fim, a mobilidade social é a possibilidade de um indivíduo mudar de posição dentro de uma sociedade estratificada. Essa mobilidade social, ou seja, mudar de camada dentro de uma estrutura hierarquizada (seja ascensão ou queda) significa ter acesso a mais ou menos possibilidades e poderes, mas em muitas sociedades esse movimento é muito difícil de acontecer ou até mesmo impossível.
FORMAS DE ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL
CASTAS
As castas são compostas de um grande número de grupos nos quais os indivíduos compartilham características históricas e hereditárias, logo, aspectos como ascendência e a ancestralidade são determinantes. Essa forma de estratificação não apresenta nenhuma possibilidade de mudança de posição social, por isso, é chamada de fechada, ou seja, a pessoa que pertence a uma casta só pode casar-se com um membro da mesma (a endogamia, como chamamos).
Apesar de não ser mais reconhecido juridicamente há décadas, o sistema de castas na Índia foi muito duradouro e concorreu para organizar a vida material e cultural de uma enorme população por séculos, deixando inegáveis consequências na situação de desigualdade social no país.
ESTAMENTOS
Os estamentos são constituídos como uma forma de estratificação social, com camadas sociais mais fechadas do que as classes e mais abertas do que as castas. Por isso, chamamos esse sistema de semiaberto. Os estamentos são reconhecidos por lei e geralmente ligados ao conceito de honra. O prestígio social é um fator decisivo para entender a posição da pessoa na sociedade.
Temos nas sociedades pré-capitalistas, como a sociedade feudal e a sociedade de transição na Europa, os maiores exemplos. A nobreza e o clero tinham posições no topo das estruturas sociais porque tinham prestígio social, nome, e ganharam respeito por isso, sendo reconhecidos socialmente. Em oposição, comerciantes, artesãos e camponeses pagavam tributos aos nobres, bem como os servos que pagavam taxas aos senhores e não possuíam privilégios. Percebemos, portanto, que nessa forma de estratificação a mobilidade social existe, porém é muito restrita.
⇫ Charge do período da Revolução Francesa (1789) satirizando um camponês carregando membros do clero e da nobreza nas costas. ⇫
CLASSES SOCIAIS
As classes são constituídas a partir de uma forma de estratificação social na qual a diferenciação dos indivíduos é feita de acordo com critérios econômicos e de poder aquisitivo. Não há desigualdade de direito, pois a lei prevê que todos sejam iguais, independentemente de sua condição de nascimento ainda que haja uma desigualdade de fato, como é facilmente percebido por todos, pela questão da renda.
Nessa forma existe a mobilidade vertical pois o indivíduo muda de classe social (subindo ou descendo na hierarquia social), mas há também há a mobilidade horizontal em que, dentro da mesma camada social, pode haver algum tipo de alteração (por exemplo, mudar de emprego, de ocupação profissional), sem que o indivíduo mude de classe social.
ESTRATIFICAÇÃO E DESIGUALDADES: TEORIAS CLÁSSICAS
Karl Marx vai apontar a divisão em classes sociais como fator fundamental para entender o cenário de social e, principalmente, de desigualdades sociais. Marx vai olhar de forma crítica a propagada igualdade jurídica e política nas sociedades capitalistas pois, na prática, as relações sociais de produção estabelecem desigualdades entre os indivíduos, uma vez que na organização da vida material, as sociedades vão estabelecer uma nítida separação baseada na propriedade privada dos meios de produção.
Essa divisão apresenta a classe dos proprietários dos meios de produção (burguesia) e a classe dos não proprietários dos meios de produção (proletariado ou classe trabalhadora). Para Marx, o proletariado vende sua força de trabalho em troca de salário, mas a burguesia paga um valor menor do que aquilo que o trabalhador gerou em forma de riqueza. É nessa diferença entre o valor produzido pelo trabalhador e o que é pago pela burguesia em forma de salário (mais valia) que está a origem do lucro da classe burguesa. Com isso, a burguesia estabelece com o proletariado uma relação de exploração e opressão, promovendo um cenário de permanente conflito e interesses antagônicos.
Já Max Weber entende que a estratificação social tem explicações não apenas na esfera econômica. Weber aponta três esferas para o entendimento sobre formas de estratificação.
A primeira fala sobre classe, mas de uma forma que considera classe como agrupamentos de indivíduos a partir de fatores como propriedade de bens, interesses e oportunidades. Portanto, diferente de Marx, a classe é dada não apenas pela posição do indivíduo nas relações de produção.
O segundo ponto trata do status. O status de um indivíduo está no prestígio social e na honra e como essa reputação vai possibilitar que ele goze de mais ou menos privilégios na sociedade.
Por fim, no plano da política, temos os partidos que são grupos de indivíduos que se organizam para influenciar nas decisões políticas. Esses agrupamentos buscam, através de formas de organizações burocráticas, impor suas aspirações e desejos sobre os demais.
DESIGUALDADES SOCIAIS E ESTRATIFICAÇÃO NO BRASIL
Se analisarmos a estratificação social no Brasil, a maioria dos estudos nos aponta para a discussão acerca de fatores socioeconômicos. Em uma sociedade na qual a escravidão tomou posição de destaque durante tanto tempo, a primeira classificação é relativa ao trabalho, separando escravos e livres.
Entramos assim em outro fator de classificação em que se misturavam classe e raça. A cor, ou melhor, os estigmas raciais, principalmente da raça negra, eram critérios de segregação, impediam ou limitavam a ascensão social. Quando se fala em “subir” de nível social, isso significa subir para a classe dos privilegiados, que exerciam influência na sociedade: a classe dos ricos. A propriedade, a riqueza, eram fatores determinantes na escala social, mas não eram exclusivos. Havia negros ricos; não muitos, mas havia; e eles jamais fariam parte da classe alta, pois o elemento racial esteve presente. Não é por acaso que, ao delinear-se a sociedade brasileira em formação, aparece o complexo do branqueamento, num país em que os “brancos puros” formavam tão pequena minoria. Cresce o complexo de ser o brasileiro de raça inferior que por muito tempo vai acompanhar os intelectuais brasileiros.
As classes sociais não eram estáticas; não existindo, como em sociedades mais antigas, um critério de nobilitação, como o nascimento, a pessoa podia mudar de posição na escala social, seja enriquecendo-se e subindo, seja perdendo os bens e descendo, em dura competição. Os grandes comerciantes, muitos deles estrangeiros, não eram bem vistos pelos brasileiros; foi em relação a eles que começou uma diferenciação entre portugueses e brasileiros, e muitos movimentos populares nasceram de reação ou protesto contra eles.
A ostentação de riqueza sempre foi importante. Em muitas igrejas de Minas Gerais é possível, ainda hoje, imaginar a cena: à frente, em destaque junto aos presbitérios, recebendo as honras do incenso e da paz, as pessoas de importância especial; ao centro da nave, isoladas por grades de madeira, as mulheres brancas, sentadas no chão; em redor das grades, os homens brancos; na entrada e fora da porta, os pobres e escravos.
Isso acabou por influenciar a exclusão do afro-brasileiro, e essa questão tem sido colocada em evidência por diversas análises de natureza sociológica e antropológica, constatável a partir da simples visualização de dados estatísticos. Uma análise dos indicadores sociais que o IBGE publicou em 1999 permite aferir que a população branca ocupada tinha um rendimento médio de 5 salários mínimos, enquanto os negros e pardos alcançavam valores em torno de 2 salários mínimos; ou seja, menos da metade dos rendimentos médios dos brancos. Estas informações confirmam a existência e a manutenção de uma significativa desigualdade de renda entre brancos, negros e pardos na sociedade brasileira.
Portanto, e isso ainda é comprovado por outros órgãos de pesquisa, a disparidade social e, consequentemente, de oportunidades entre brancos e afrodescendentes (se levarmos em consideração a divisão por cor, como faz o próprio Estado) é grande e a distribuição de renda e de escolaridade ocorre da mesma forma através desse quadro.