GÊNERO, MULHERES E SOCIEDADE
As chamadas “minorias” não necessariamente são marcadas por um grupo de menor expressão quantitativa em uma sociedade.
O QUE SÃO MINORIAS SOCIAIS?
Quando utilizamos o termo “minoria”, estamos fazendo referência ao fato de determinado grupo não possuir os mesmos direitos socioeconômicos que os demais grupos da sociedade. O grupo majoritário socialmente tende a possuir maiores condições de acesso social, muitas vezes utilizando de sua posição para ascender economicamente e politicamente.
Uma das melhores definições sobre o conceito de minorias foi elaborada pelo sociólogo alemão L. Wirth, que define minoria como “um grupo de pessoas que, por causa de suas características físicas ou culturais, são isoladas das outras na sociedade em que vivem, por um tratamento diferencial e desigual, e que por isso se consideram objetos de discriminação coletiva”.
Entre os principais exemplos de minorias sociais podemos destacar as mulheres, negros, indígenas, homossexuais, moradores de regiões de baixa renda, idosos, deficientes, entre outros. É importante observar que as minorias sociais são grupos que passam por elevados processos de preconceito e estigmatização, muitas vezes resultando em processos de exclusão social grave. Elas possuem dificuldade em adentrar em diversos espaços, como meios educacionais, ambientes de representatividade política e nos melhores postos do mercado de trabalho.
Um preconceito contra alguma minoria só consegue manterse se for aceito por uma relevante camada da sociedade. Para que ele exista, é necessário um conjunto de pessoas que aceite, concorde e difunda esse formato de mundo, sendo assim, devemos observar que o combate ao preconceito contra minorias está no combate material e ideológico contra determinados grupos e seus privilégios.
Deve-se atentar que as minorias não são passivas à opressão sofrida, por isso, diversos grupos organizam-se em forma de movimentos sociais em busca de conseguir uma melhora nas condições de vida. Dentro da realidade brasileira podemos destacar o movimento negro e o movimento feminista, como grupos em permanente luta por direitos.
Atualmente, é possível observar um processo de criminalização dos movimentos sociais, já que eles buscam derrubar determinados privilégios de grupos dominantes. É comum observar a mídia ou correntes políticas, que abordam esses movimentos como fonte de desordem e caos social, não trabalhando ou abrindo espaço para que se discuta suas verdadeiras pautas. Essa estratégia faz com que muitas vezes parte da população não consiga observar a realidade do embate sociopolítico.
QUESTÕES DE GÊNERO E O MOVIMENTO FEMINISTA
GÊNERO
O debate sobre gênero é um elemento fundamental da contemporaneidade com força dentro de instituições políticas
e educacionais, além articular ações artísticas, estéticas e culturais. As pautas não são homogêneas e as argumentações, por vezes, tendem a transitar por critérios religiosos ou elementos tradicionais e históricos de nossa realidade, fonte de intensos e amplos conflitos.
Do ponto de vista das Ciências Sociais, cabe apontar pensadoras relevantes sobre o tema. Simone Beauvoir (1908 – 1986) foi e ainda é uma das referências dessa questão, tanto no aspecto de construção intelectual como na militância política, tendo em seu livro O Segundo Sexo (1949), uma forte denúncia da condição da mulher dentro da sociedade. Beauvoir diz em sua obra que “o homem é definido como ser humano e a mulher é definida como fêmea. Quando ela comporta-se como um ser humano ela é acusada de imitar o macho”, essa fala da autora francesa demonstra a intensa problematização realizada em meados do século XX.
⇫ Simone de Beauvoir (1908 – 1986) ⇫
Dentro do estudo das diferenças culturais, a antropóloga Margaret Mead (1901 – 1978) vai realizar um amplo trabalho de campo com diversas tribos na Oceania. A autora vai relatar que nas culturas estudadas, em muitos cenários, as mulheres apresentam características associadas aos homens como hostilidade, bravura e agressividade; em oposição, os homens apresentam comportamentos historicamente associadas às mulheres como docilidade, sutileza e afetividade. Apresentou, inclusive, tribos com os papéis sociais invertidos: mulheres em posições de poder e privilégios e homens em desvantagens sociais.
A partir dessas perspectivas temos uma distinção entre “sexo” e “gênero”. O sexo é entendido como características físicas biológicas, elementos inatos, que nascem com os indivíduos. Já o gênero trata de uma construção social e histórica com atos, símbolos, gestos, significados e, em especial, os papéis sociais, ou seja, aquilo que é esperado socialmente como o comportamento de um homem ou de uma mulher.
O MOVIMENTO FEMINISTA
O movimento feminista não pode ser definido como algo completamente homogêneo em relação a sua trajetória histórica e pautas. A realidade social é formada por fatores históricos, sociais, econômicos, culturais e políticos que estabelecem distinções e hierarquizações e, claro, essas desigualdades estão presentes dentro da vivência das mulheres por todo o mundo e se refletem na própria dinâmica do movimento feminista. E da mesma forma como não há consenso em relação às pautas, entre historiadoras e historiadores não há um pleno acordo em relação à trajetória do movimento.
Há uma visão que aponta para pautas pioneiras do feminismo ainda no Século XVIII com Olympe de Gouges (1748 – 1793) que, no contexto da Revolução Francesa, escreveu a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã (1791) com denúncias a uma lógica patriarcal na sociedade francesa e clamando por igualdade e direitos para as mulheres.
O período marcado entre o fim do Século XIX e início do Século XX marcou atuação de mulheres em movimentos organizados juntos às lutas operárias. Articuladas em movimentos com orientações anarquistas e socialistas, formaram lideranças e pautas feministas de trabalhadoras nos meios urbano e rural.
A atuação se deu nas lutas na esfera econômica, mas não somente nela. Esse período de virada entre os séculos XIX e XX marcou a conquista do voto feminino. As mulheres, com destaque para a atuação no Reino Unido, se organizaram em um movimento que ficou conhecido com o Movimento Sufragista que alcançou a pauta do sufrágio feminino, entre outros direitos. No Brasil, o movimento esteve organizado a partir da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, conquistando o direito ao voto em 1932, sendo ratificado com a Constituição de 1934.
Entretanto, como dissemos o movimento feminista não é homogêneo já que os recortes sociais tendem a gerar discordâncias em relação à urgência de certas pautas. Desenvolvido pela professora Kimberlé Crenshaw (1951 – ), o termo interseccionalidade ajuda a entender essa questão. No contexto social, há diferenças e opressões de gênero, mas também de raça, classe e orientação sexual, desse modo, a atenção no estudo e construção do movimento feminista também deve levar em conta essas diferenças e hierarquizações. Angela Davis (1944 – ), negra, filósofa e ativista de orientação socialista, desenvolve um trabalho centrado na sobreposição de formas de violência, em especial gênero, raça e classe, estabelecendo crítica ao encaminhamento do feminismo branco e ocidental que, em certa medida, não leva em conta o combate ao racismo com aspecto fundamental na militância política, reproduzindo uma lógica de discriminação racial dentro do movimento feminista. No Brasil essa questão foi contemplada pela socióloga e militante Lélia Gonzalez (1935 – 1994) que reforça a necessidade de destacar a questão racial como ponto fundamental da pauta feminista, bem como destacar a condição de opressão das mulheres indígenas no país.