Geopolítica e a Velha Ordem Mundial
A geopolítica pode ser definida como um conjunto de estratégias, práticas e ações realizadas, na maior parte das vezes, pelos Estados Nacionais, a fim de promover a defesa de seus territórios
GEOPOLÍTICA E AS DISPUTAS INTERNACIONAIS DE PODER
Portanto, compreender a geopolítica significa entender como funcionam as relações internacionais entre países e as respectivas estratégias adotadas por eles para manter o poder sobre seus territórios ou conquistar novas áreas de influência.
Tais relações internacionais e ações geopolíticas muitas vezes vão além da própria noção de Estado, e envolvem a constituição de organizações regionais e mecanismos internacionais, a exemplo da ONU (Organização das Nações Unidas) e da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), que são instituições supranacionais – ou seja, que ultrapassam as fronteiras de uma nação e influenciam na atuação de diversos países.
As discussões internacionais, através dos meios de comunicação, a respeito do uso de armas, a invasão de países, as negociações para retiradas de tropas, o deslocamento de soldados, a abertura ou o fechamento de embaixadas ou mesmo as ameaças feitas por líderes internacionais a outros países são exemplos de ações geopolíticas.
A geopolítica mundial está em constante mudança, e em cada época da história, existe a presença de um ou mais países no comando das relações internacionais. Por exemplo, durante o século XVIII, a Inglaterra era o país mais poderoso, e por isso mesmo conseguia influenciar e dominar muitos outros países. Já durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha esteve muito próxima de chegar a essa posição, e por pouco não venceu a guerra – o que daria a ela uma posição de hegemonia internacional.
Dessa forma, podemos dizer que em cada época a geopolítica mundial está “ordenada” de uma determinada maneira. Antes das Guerras Mundiais, a “ordem mundial” funcionava de um jeito; depois, com a vitória de alguns países e a derrota de outros, a “ordem mundial” foi modificada, e novos países passaram a ter a hegemonia, ou seja, o controle, das relações internacionais. Nesse sentido, vale a pena destacar as duas últimas “ordens mundiais”: a que vigorou entre 1945 e 1991 (e atualmente é chamada de Velha Ordem Mundial) e a dinâmica atual de poder internacional, que se iniciou nos anos 1990, e é chamada de Nova Ordem Mundial – por ainda estar em vigor.
ANTECEDENTES DA VELHA ORDEM MUNDIAL
A REVOLUÇÃO RUSSA (1917)
Na passagem do século XIX para o século XX a Rússia ainda se apresentava como um império Czarista (governado por mais de trezentos anos pela dinastia Romanov). Nesse contexto o governo passava a sofrer grandes críticas e pressões de orientação econômica, política e social. Entre as principais críticas se destacavam:
• Atraso tecnológico (os poucos avanços no campo industrial fizeram com que a sociedade permanecesse com suas bases agrárias, que gerou insatisfação por parte dos camponeses, operários e pela classe burguesa).
• Elevados gastos com conflitos como a guerra Russo-Japonesa (1904-1905) em um contexto na qual existia uma sociedade marcada pelo analfabetismo (cerca de 90%) e grande desigualdade social.
Nesse período histórico formou-se o Partido Operário Social Democrata Russo (POSDR) que representava uma oposição ao czarismo e de inspiração marxista, mas com grandes divergências intelectuais entre seus membros, que eram divididos em Bolcheviques e Mencheviques.
• Mencheviques – Marxistas ortodoxos que afirmavam que o socialismo seria possível apenas após avanços/reformas no sistema capitalista (Liderança: Iulli Martov).
• Bolcheviques – A aliança entre operários e camponeses seria o caminho para uma imediata revolução socialista e o início de uma ditadura do proletariado (Liderança: Vladmir Lênin).
A entrada da Rússia na Primeira Guerra Mundial (1914-1918) causou um maior enfraquecimento do poder exercido pelo czar Nicolau II que foi derrubado em fevereiro de 1917 (Revolução de Fevereiro) após um grande conjunto de manifestações e greves realizadas por camponeses, operários e militares.
Após essas mudanças iniciou-se um período conhecido como Governo Provisório, formado por uma aliança entre o soviete de petrogrado (trabalhadores e militares) e burgueses liberais. Essa junção logo mostrou-se frágil, principalmente pelos diferentes interesses dos burgueses e do proletariado (os sovietes de petrogrado eram contra a permanência na guerra enquanto os burgueses defendiam a permanência).
O resultado desse embate foi que em Abril de 1917 Lênin encaminhou aos Bolcheviques as propostas e teses da retirada da guerra e a dissolução do Governo Provisório.
Em outubro de 1917, Lênin e Trotsky lideraram a revolução Bolchevique (Revolução de Outubro) que se utilizou do comunismo de guerra na luta do exército vermelho contra o exército branco (orientação conservadora).
Entre as principais mudanças nesse contexto destacamos a criação da NEP (Nova Política Econômica) em 1921 e a formação da União Soviética (URSS) em 1922.
A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1939-1945)
O expansionismo da Alemanha teve uma relação grande com o início desse conflito. A retomada da Renânia (1936), a anexação da Áustria (1938) e a ocupação da Tchecoslováquia (1939) levou a uma Política de Apaziguamento em que Inglaterra e França legitimaram essas ações contanto que não houvessem mais invasões e anexações.
Esse Conflito de proporções globais, teve início então após a invasão da Polônia pelos alemães (nazismo) em setembro de 1939 (as bases dessa invasão para os nazistas foi a discordância de Hitler com a divisão das fronteiras entre os países desde o Tratado de Versalhes).
ALIANÇAS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
Aliados – Reino Unido, França, União Soviética (1941) e Estados Unidos (1941).
Eixo – Itália, Alemanha e Japão.
Esse conflito foi dividido em três etapas:
• Supremacia Alemã e Avanços do Eixo (1939-1941) – Itália no norte da África; Alemanha na Europa e Japão no Oceano Pacífico. Nesse período destaca-se a batalha na França (1940), a batalha na Inglaterra (1940), a invasão da União Soviética em 1941 (Operação Barbarossa) e o ataque do Japão a base de Pearl Harbor (1941).
• Equilíbrio de Forças (1941-1944) – As ofensivas dos Aliados causou o recuo das forças do Eixo, tendo como importantes passagens a Batalha de Stalingrado (1943) e a Conferência de Teerã (1943).
• Derrota do Eixo (1944-1945) – A vitória dos aliados, que teve como uma de suas principais passagens a invasão da Batalha de Normandia em 1944 (Dia D). Isso ocorreu após batalhas vencidas que os encaminharam para a Europa Central e a libertação do leste europeu pelos soviéticos.
A Batalha de Stalingrado (1942-1943)
Apesar da assinatura de um tratado de não agressão entre União Soviética e Alemanha em 1939, o rompimento desse acordo levou a diversos conflitos entre esses países. A importante batalha que ocorreu na cidade de Stalingrado (atualmente Volgogrado), que está localizada na região do Cáucaso às margens do rio Volga, foi a mais emblemática desses diversos conflitos.
A resistência soviética aos constantes ataques nazistas teve o inverno como um importante aliado na derrota por parte da Alemanha no front oriental da Segunda Guerra Mundial.
A Batalha de Normandia – O Dia D (1944)
A chamada operação Overlord em Junho de 1944, foi uma passagem na guerra de grande importância para as forças aliadas, em que soldados entraram no território francês com bombardeios, invasão naval e operações de paraquedistas. Esse evento marcou o início da vitória sobre nazistas no ocidente.
Após longos seis anos de conflitos, a Segunda Guerra Mundial teve como importante passagem que representou o seu final, o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki (armamento nuclear) nos dias seis e nove de agosto de 1945. O cenário de destruição causado pelos Estados Unidos serviu como um símbolo do seu poderio bélico em comparação aos demais países do globo.
• Conferência de Yalta (Fevereiro – 1945) – Encontro entre as potências aliadas em que discutiram questões territoriais após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
• Conferência de Potsdam (1945) – Reunião que estabeleceu a divisão do território da Alemanha entre Estados Unidos, União Soviética, Reino Unido e França, criou o Tribunal de Nuremberg e estabeleceu a desmilitarialização da Alemanha.
A GEOPOLÍTICA ENTRE 1945 E 1991: A VELHA ORDEM MUNDIAL
A velha ordem mundial (1945 a 1989) foi marcada pelo conflito – Guerra Fria – entre o socialismo soviético e o capitalismo norte-americano, basicamente dividindo o mundo em duas partes: capitalista e socialista (mundo bipolar).
O uso do termo “Guerra Fria” está relacionado a um conflito direto?
O uso desse termo faz referência a um período de disputas entre Estados Unidos (capitalismo) e União Soviética (socialismo) por áreas de influência em que os países realizaram investimentos em armamento (corrida armamentista), mas que não levou a um conflito direto pela ideia da “Destruição Mútua Assegurada”.
O historiador Eric Hobsbawm em seu livro “A Era dos Extremos” justifica a utilização desse termo em uma citação.
“a guerra consiste não só na batalha, ou no ato de lutar: mas num período de tempo em que a vontade de disputar pela batalha é suficientemente conhecida” (Hobbes, capítulo 13).
Apesar da ausência de conflitos diretos entre as duas grandes potências do período, ocorreram conflitos indiretos em algumas regiões do globo.
• Guerra das Coreias (1950-1953).
• Guerra do Vietnã (1959-1975).
• Crise dos Mísseis em Cuba (1962).
Após a Segunda Guerra Mundial a Europa ficou destruída, possibilitando que emergissem duas novas grandes potências – EUA e URSS – que passaram a traçar e ditar as diretrizes políticas, econômicas e militares mundiais. Isso de origem ao período chamado de Guerra Fria, que perdurou até a queda do muro de Berlim, 1989, seguida pela desintegração da URSS, dois anos depois.
A Guerra Fria caracterizou-se por um constante estado de tensão, que estimulou a corrida armamentista entre EUA e URSS. Esse estado de tensão foi ironicamente chamado de coexistência pacífica – uma coexistência baseada no equilíbrio do terror, já que tanto os EUA e a URSS possuíam armas nucleares capazes de destruir o mundo várias vezes. Outra característica do período foi a polarização ideológica extremada, com perseguições políticas e morte aos opositores internos de lado a lado. O macarthismo – perseguição aos comunistas nos EUA – e o stalinismo – ênfase no desenvolvimento do socialismo – foram as facetas mais visíveis dessa polarização.
O MUNDO BIPOLAR DA VELHA ORDEM MUNDIAL
Bipolarização – A ideia da formação de um mundo bipolar está relacionada a polarização da geopolítica global por Estados Unidos (capitalismo) e União Soviética (socialismo). Nesse período os países do globo eram regionalizados de acordo com um critério político.
• Primeiro Mundo – Países do bloco capitalista de economia mais desenvolvida (Liderança: Estados Unidos – EUA).
• Segundo Mundo – Países do bloco socialista (Liderança: União Soviética – URSS).
• Terceiro Mundo – Países capitalistas disputados como áreas de influência. (Conferência de Bandung – países não-alinhados).
A ideologia da Guerra Fria camuflou o aumento das desigualdades e das expropriações dos países do hemisfério sul em benefício aos do hemisfério norte. O processo de concentração de riquezas ampliou-se, revelando a face perversa do capitalismo e a incompetência do socialismo. Os EUA tomaram a dianteira nesse confronto, aplicando a chamada Doutrina Truman, que consistia em “cercar” a URSS, através de uma “barreira sanitária”, impedindo sua expansão territorial e ideológica, tentando evitar que o socialismo fosse disseminado entre outros países, além de apoiar militarmente outros países que repudiavam o socialismo.
A ofensiva americana não se restringiu aos aspectos militares. No plano econômico, o Plano Marshall, instituído em 1947, estabeleceu uma assistência ampla e eficiente destinada à reconstrução da Europa Ocidental, de modo a melhorar o padrão de vida nos países empobrecidos pela Segunda Guerra Mundial e mantê-los fora da esfera de influência soviética.
Desse modo, os EUA conseguiram, devido ao plano, não só manter seus níveis internos de produção e emprego, como também abastecer, reequipar e financiar a recuperação dos países capitalistas europeus e do Japão, ampliando o domínio sobre eles e neutralizando a URSS nessas áreas.
A CORTINA DE FERRO (1946)
“Do Estetino, no [mar] Báltico, até Trieste, no [mar] Adriático, uma cortina de ferro desceu sobre o continente. Atrás dessa linha estão todas as capitais dos antigos Estados da Europa Central e Oriental. Varsóvia, Berlim, Praga, Viena, Budapeste, Belgrado, Bucareste e Sófia; todas essas cidades famosas e as populações em torno delas estão no que devo chamar de esfera soviética, e todas estão sujeitas, de uma forma ou de outra, não somente à influência soviética mas também a fortes, e em certos casos crescentes, medidas de controle emitidas de Moscou.“
(Winston Churchill – 5 de Marco de 1946)
Na década de 1970 ocorreu uma grande expansão do complexo industrial-militar de ambos os lados. Americanos e soviéticos promoveram altos investimentos em pesquisas, resultando em grandes avanços tecnológicos. Entretanto a corrida armamentista levou ao esgotamento de recursos, ao aumento do déficit público e dos problemas sociais e econômicos de ambos os lados.
Bomba de Hiroshima (potência de 0,015 kilotons de TNT)
Com a inflação e o desemprego em níveis preocupantes, e com a influência mundial dos EUA em declínio, Ronald Reagan, presidente americano entre 1980 a 1988, passou a adotar uma política econômica liberal, provocando mudanças radicais ao implementar a austeridade nos gastos públicos, incentivos às empresas (diminuição de impostos) e maior protecionismo interno (barreiras alfandegárias).
Reagan foi responsável pela retomada da corrida armamentista, espacial e pela prática de uma política externa agressiva, contribuindo para o colapso da URSS, que para manter frente às provocações e avanços tecnológicos dos americanos, viu-se obrigada a desviar recursos de sua economia já exaurida para pesquisas militares. Com um parque industrial obsoleto e graves dificuldades de abastecimento, a URSS evoluiu gradativamente para um estado de deterioração geral.
Na década de 1980 o enfraquecimento da União Soviética mostrava que o fim do conflito se aproximava. Como dito anteriormente, entre as principais causas do enfraquecimento soviético, destacamos:
• Descontentamento populacional com a censura e a falta de liberdade política, cultural e econômica na União Soviética
• Os elevados gastos da União Soviética para manter a Corrida Armamentista e Espacial, além do auxílio financeiro a outros países do bloco socialista.
• O atraso tecnológico do parque industrial da União Soviética.
No governo de Mikhail Gorbatchev (1985-1991) o lançamento da Perestroika e da Glasnost, representaram tentativas de melhorar as condições do país
• Perestroika – Busca pela reestruturação econômica.
• Glasnost – Maior transparência dos mecanismos políticos do país.
Assim, ao longo dos anos 1980 e início dos anos 1990, os EUA recuperaram-se econômica e financeiramente e, com a desintegração da URSS, retomaram espaços perdidos e assumiram a posição de única potência hegemônica em escala mundial. O período pós-Guerra Fria, que ficaria conhecido como “Nova Ordem Mundial”, dá seguimento ao aperfeiçoamento e ao redimensionamento dos países capitalistas industriais em crise, que buscam solucioná-la através de políticas econômicas de cunho liberais, que passariam a ser chamadas de neoliberalismo.
QUEDA DO MURO DE BERLIM
• Essa estrutura física construída na cidade de Berlim foi durante muito tempo o grande símbolo da existência da Guerra Fria. Portanto, a sua derrubada foi uma das mais importantes passagens que representava que esse conflito ideológico se aproximava do seu fim.
• A conferência de Potsdam (1945) dividiu o território da Alemanha em zonas de influência/controle por quatro países: Estados Unidos (EUA), União Soviética (URSS), Reino Unido e França. Dessa maneira o país foi dividido em República Federal da Alemanha – RFA (capitalismo) e República Democrática Alemã – RDA (socialismo).
• Com o lançamento do Plano Marshall (1947) que desrespeitou as conferências de Potsdam e Yalta foi estabelecido um bloqueio a Berlim de 1947 até 1949.
• Em 1961, na tentativa então de conter as migrações entre as duas partes de Berlim, teve início a construção do muro.
MUDANÇAS TERRITORIAIS COM O FIM DA GUERRA FRIA
• União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) -Rússia, Letônia, Estônia, Lituânia, Bielorússia (Belarus), Ucrânia, Moldávia, Geórgia, Armênia, Azerbaijão, Cazaquistão, Quirguistão, Uzbequistão, Tadjiquistão e Turcomenistão.
• Unificação da Alemanha – RFA e RDA.
• Fragmentação da Iugoslávia – Bósnia e Herzegovina, Croácia, Montenegro, República da Macedônia, Sérvia, Eslovênia e Kosovo (parcialmente reconhecido como um país independente).
• Separação da Tchecoslováquia – República Tcheca e Eslováquia.