VARIAÇÃO LINGUÍSTICA II – TEMPORAL E SITUACIONAL
Aprenda sobre Variação Linguística Temporal e Situacional.
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Receita de acordar palavras
Palavras são como estrelas
Facas ou flores
Elas têm raízes pétalas espinhos
São lisas leves ou densas
Para acordá-las basta um sopro
Em sua alma
E como pássaros
Vão encontrar seu caminho.
(MURRAY, Roseana. Receitas de olhar, SP: FTD, 1997)
No poema, a autora define subjetivamente o que são palavras. Para tanto, realiza comparações com elementos da natureza (“estrelas”, “flores”) e com instrumentos do cotidiano (“facas”) para, então, atribuir características (“lisas”, “leves”, “densas”). Pode-se dizer que a poetisa utilizou, por meio da língua, a linguagem da poesia para expressar um discurso. Segundo Celso Cunha & Lindley Cintra, “a distinção entre linguagem, língua e discurso, [é] indispensável do ponto de vista metodológico”, isto é, é necessário que se realize a diferença entre esses conceitos para uma melhor compreensão do processo de comunicação humana.
O conceito de linguagem está relacionado à expressão da língua. Língua é um sistema gramatical que pertence a um grupo de indivíduos e discurso é a reprodução da língua por meio de uma linguagem executada por um indivíduo dentro de um convívio social. A partir da diferenciação entre língua, linguagem e discurso fica claro que o processo de comunicação implica a troca de conhecimentos e experiências entre os indivíduos envolvidos, ou seja, o ato da fala/escrita está relacionado a um ato social.
Como um instrumento de ação social, a língua é dinâmica, por isso, modifica-se constantemente. Palavras ou expressões usadas numa determinada região ou por um período histórico ou por uma faixa etária demonstram diferentes situações de uso da língua, e constituem, deste modo, variações da língua ou linguísticas. A variação ocorre porque a sociedade não é uniforme; ao contrário, é dividida em grupos: há os mais velhos e os mais jovens; há os que pertencem a este ou àquele grupo social; há os que têm esta ou aquela profissão e assim por diante. Percebemos, com muita facilidade, o fenômeno da variação na pronúncia e no vocabulário. No entanto, ele ocorre em todos os planos da linguagem.
(FIORIN, José Luiz, em Painéis da variedade. Revista Língua Portuguesa, Ed. Segmento, nº 23, ano II, 2007)
Em letras de música, é muito comum o eu lírico do texto usar uma linguagem com marcas de um registro popular, seja para adequar seu discurso ao contexto da música, seja para atingir o interlocutor de maneira direta. Veja este trecho da música Berreco, de Claudinho e Buchecha:
Berreco, abre o seu olho
para outro não tomar sua sopa.
Mantenha sua barba de molho,
sua mina anda quase sem roupa.
E sai por aí dando bolada,
ela só que zoar,
ela nem quer saber
A música utiliza uma linguagem adequada ao universo do funk. A “suposta” traição da mulher é descrita como “dar uma bolada”, sinal de que outro está “tomando a sua sopa”. O vocabulário aqui empregado é perfeitamente adequado ao contexto sociolinguístico dos músicos. A norma culta, se empregada nessa música, seria totalmente inadequada. Assim mostra-se que a língua varia de forma a adaptar-se à situação de emissão e a seus interlocutores. Advém daí, também, a interligação com a faixa etária dos falantes, demonstrando as modificações na língua através das gerações.
As gírias, as expressões próprias de grupos de igual faixa etária, os desvios da coloquialidade fazem parte da norma popular. Do falante de língua portuguesa espera-se que ele domine não somente a norma culta, mas também as nuances da norma popular para que, dependendo do contexto em que se está inserido, faça-se uso de uma ou outra norma, adequando a variabilidade utilizada ao contexto discursivo.
Outro fator que envolve o estudo da língua e da linguagem tem causado, ultimamente, uma enorme preocupação e tem sido motivo de fóruns de discussões: o uso de estrangeirismos na língua. Entende-se como estrangeirismo (de estrangeiro + ismo) o emprego de termos estrangeiros ou locução estrangeirada na fala ou na escrita do português. Os estrangeirismos utilizados presentemente, tanto em Portugal como no Brasil, para já não falar nos outros países de língua oficial portuguesa, são muitos, alguns justificáveis, outros nem tanto.
Exemplos:
fax, site, on-line, software.
Até que ponto tal fato representa um enriquecimento, ou, o contrário, uma desvalorização do idioma? Países como França e Espanha criaram leis que regulam o uso de palavras estrangeiras ao seu idioma em anúncios, lojas e restaurantes. No Brasil, existem movimentos que apontam para esse procedimento. De qualquer forma, a língua pode ser um instrumento de subserviência cultural, dependendo de como o falante nativo interaja com essas possibilidades da utilização do sistema linguístico. Alguns estrangeirismos já são incorporados na língua, como shampoo [inglês] ou abajour [francês] e já estão “aportuguesadas” para “xampu” e “abajur”. Outras são usadas na sua formação original e ainda não sofreram esse processo, como shopping ou release. Contudo, há palavras, como meeting ou paper, que são totalmente dispensáveis, pois já existem correspondentes no português: [encontro]; [artigo]. Na verdade, indicam uma elitização da palavra, uma sofisticação que implica uma desvalorização do idioma materno e uma subserviência cultural que em nada contribui para a nossa formação.
Além disso, é claro, a variante linguística está condicionada pelo grau de formalidade existente na situação em que se dá o ato da fala, ou da finalidade, no ato da escrita. Assim, escolhas por determinados termos levam em consideração a situação em que se encontra o falante, que pode optar por termos estranhos à língua portuguesa para demonstrar maior “valor” ou “conhecimento” naquilo que está sendo dito.
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