Um pouco sobre o absolutismo e como isso influencia o ENEM
Percepções sobre como tão poucos concentraram tanto poder

Palácios majestosos, jardins megalomaníacos, bailes e banquetes grandiosos. Cortesãos pavonados, bobos da Corte e perucas sobre as cabeças. Tais visões tendem a vir ao nosso imaginário todas as vezes em que pensamos a respeito do tal Absolutismo. Ainda que, neste caso, o senso comum não nos iluda tanto, é pertinente que averiguemos um pouco mais a fundo as características deste fenômeno político tão marcante da Era Moderna, assim como as distintas maneiras como ele se apresentou em diferentes tempos e regiões do continente europeu. Busquemos entender de que maneira este conteúdo costuma ser cobrado pelo ENEM e tentemos esclarecê-lo. Vamos em frente. Sobre a formação das monarquias absolutistas
Para que compreendamos melhor o fenômeno político que foi o absolutismo monárquico, precisamos, primeiro, lançar os olhos sobre um pouco do que foi o processo de formação dos Estados Nacionais Modernos europeus – tais como Portugal, Espanha, França, Inglaterra etc –Foi durante este processo, iniciado ainda na Baixa Idade Média, que determinadas dinastias reais concentraram, através de vários métodos, cada vez mais poderes em suas mãos. Para exemplificar o que está sendo dito, remetamos ao século XIV.
Portugal, desde o século XI, já se formava enquanto Estado Nacional em meio ao contexto da chamada Guerra de Reconquista, que tinha como objetivo a expulsão definitiva dos mouros, muçulmanos invasores da Península Ibérica que lá se encontravam desde o século VIII. No século XIV, já com suas fronteiras formadas, Portugal passava por uma grande crise dinástica. A dinastia da Casa de Borgonha – primeira da história lusitana – via seu último rei falecer sem herdeiros. Iniciou-se uma guerra civil no reino que contou, inclusive, com a participação das vizinhas França e Inglaterra – também em processo de formação –. Apoiado pela burguesia, um suposto irmão bastardo do falecido rei assumia o Trono. Tinha início a Dinastia de Avis. Esta aliança entre rei e burguesia surge como uma das características mais recorrentes em meio a estes processos de consolidação do absolutismo monárquico na Europa. Analisemos, neste próximo parágrafo, um pouco acerca da comunhão de interesses entre os reis e as burguesias ao longo deste período:
Contrariamente aos antigos senhores feudais, os burgueses, em ascensão desde o chamado Renascimento Comercial e Urbano, não contavam com vassalos protetores. A formação de Exércitos Nacionais sob a tutela das monarquias em processo de consolidação era de fundamental importância para a classe burguesa, que, através do pagamento de impostos, fornecia aos reis as riquezas necessárias para a composição destas forças. Além do militarismo, a instituição de leis e tributos, além da criação de sistemas de medidas e moedas nacionais colaboravam para o empoderamento dos monarcas. Parte dessas medidas contemplava também os interesses da classe burguesa, atrelada às atividades comerciais. Sendo assim, o absolutismo combina o crescente poder militar do monarca a uma complexa burocracia centralizadora, muitas vezes interessante para a recém-surgida burguesia.
Se já entendemos a posição da burguesia em meio ao processo de consolidação do absolutismo, é importante nos atermos também ao processo de transferência de poder das antigas classes dominantes medievais para os reis absolutistas. Ora, se na Idade Média houve uma acentuada descentralização do poder devido ao processo de feudalização, onde as nobrezas feudais fragmentavam-no entre si, podemos concordar que, para que as monarquias absolutistas da Era Moderna se consolidassem, antes, primeiro, deveria haver um desgaste por parte dos senhores feudais. Isto se deu por conta, principalmente, da chamada Crise do século XIV. A Peste Negra, a fome, as rebeliões camponesas e as terríveis guerras do período abalavam a estrutura feudal europeia.
Utilizando o exemplo da formação da Inglaterra e da França, percebemos a existência de um longo e sangrento conflito apelidado de Guerra dos Cem Anos, ocorrido entre 1337 e 1453. Durante este confronto, também ocasionado devido a uma crise sucessória, desta vez relacionada ao Trono da França, diversos reis ingleses e franceses engajaram-se em campanhas militares buscando a consolidação de suas monarquias ante a ameaça inimiga. A França, vitoriosa ao fim da guerra, encontrava-se bastante centralizada. A Inglaterra ainda viveria mais trinta anos de guerra civil – a conhecida Guerra das Duas Rosas, findada somente em 1485 –. Neste contexto, diversas famílias nobres inglesas disputaram a Coroa, tendo como resultado final um grande enfraquecimento da nobreza ante a concentração de poder nas mãos da nova linhagem de monarcas que surgia ao final do conflito, a Dinastia Tudor.

Outra instituição de grande poder e prestígio ao longo da Idade Média foi a Igreja. Tal como as nobrezas feudais, a Igreja Católica também passava por um processo de enfraquecimento durante a transição da Idade Média para a Era Moderna. Isto deveu-se ao contexto da Reforma Protestante, vivida pela Europa durante o século XVI. Ao passo que diversas novas religiões cristãs não católicas surgiam, o catolicismo perdia sua hegemonia. No caso da Inglaterra, por exemplo, a Dinastia Tudor aplicou um duro golpe à Igreja quando o monarca Henrique VIII, através do chamado Ato de Supremacia 1534, instituiu o anglicanismo, religião de Estado da Inglaterra, na qual a liderança religiosa passava para as mãos do rei, excluindo-se, assim a influência papal.
Saiba mais sobre Absolutismo
Uma das maneiras encontradas pela Igreja para manter seus privilégios em meio à perda de poder foi oferecer embasamento teórico para a sustentação das monarquias absolutistas. Um dos casos mais simbólicos talvez se encontre na França. Lá, o Bispo Jacques-Bénigne Bossuet, muito próximo de Luís XIV – o famoso “Rei Sol”, considerado por muitos o mais absolutista dos reis europeus –. escreveu acerca da chamada Teoria do Direito Divino dos Reis, que definia o monarca como um vigário de Deus na terra, tendo assim, sua autoridade inquestionável. Outros famosos teóricos que serviram de pilar para as monarquias absolutistas foram Thomas Hobbes, com sua famosa obra “O Leviatã” e Nicolau Maquiavel, com o famigerado “O Príncipe”.

Veja como o assunto já foi cobrado no ENEM
Enem (2010)
"O príncipe, portanto, não deve se incomodar com a reputação de cruel, se seu propósito é manter o povo unido e legal. De fato, com uns poucos exemplos duros poderá ser mais clemente do que outros que, por muita piedade, permitem os distúrbios que levam ao assassínio e ao roubo"
MAQUIAVEL, N. O Príncipe, São Paulo: Martin Claret, 2009.
No século XVI, Maquiavel escreveu O Príncipe, reflexão sobre a Monarquia e a função do governante. A manutenção da ordem social, segundo esse autor, baseava-se na:
a) inércia do julgamento de crimes polêmicos.
b) bondade em relação ao comportamento dos mercenários.
c) compaixão quanto à condenação de transgressões religiosas.
d) neutralidade diante da condenação dos servos.
e) conveniência entre o poder tirânico e a moral do príncipe.
Para Maquiavel, o pragmatismo marca a moral política do governante (por ele referido como o “Príncipe”). De acordo com o filósofo, o intuito primeiro de um governante deve ser a manutenção da ordem social, independentemente dos meios que para este fim forem empregados. Daí a famosa frase "os fins justificam os meios". Em seu livro, espécie de manual, Maquiavel considera a tirania um importante instrumento para se obter o respeito e a ordem. Por estes motivos, a obra de Maquiavel tem enorme importância como base para os governos absolutistas.
Perceba a interdisciplinaridade presente na questão trazida acima, que mescla aspectos da História e da Filosofia política. Aproveite para assistir à aula do professor Leandro Vieira sobre o pensamento maquiavélico e excelente exposição do professor Otto Barreto acerca do fenômeno histórico do absolutismo monárquico. Não deixe de conferir nossos outros artigos para mandar absolutamente bem no ENEM!
Por Leandro Torres (BIro)