VÍRUS, BACTÉRIAS E PROTOZOÁRIOS
PRINCIPAIS DIVISÕES TAXONÔMICAS
O número de organismos diferentes no mundo ultrapassa oito milhões de espécies. Estes indivíduos estão distribuídos nos mais variados habitats e desempenham as mais diversas funções. Para a ciência, esta mera observação é capaz de levantar muitas perguntas, como, por exemplo, como estes organismos surgiram e o que os fez tão diferentes em determinados aspectos e tão similares em outros tantos.
Para responder a essa e outras perguntas o primeiro passo é organizá-los em grupos de acordo com suas similaridades. Assim, ao pensarmos em critérios mais simples, capazes de reunir grandes grupos de organismos, independentemente de suas pequenas particularidades, chegaremos a cinco grandes aglomerados – os cinco reinos de organismos vivos.
O primeiro naturalista a tentar compreender e classificar os organismos vivos foi o sueco Carl von Linné (1707 – 1778) que definiu os reinos que hoje conhecemos como Monera, Protoctista, Fungi, Plantae e Animalia. Cada um destes grupos, por sua vez, pode ser estratificado em subgrupos até que se atinja o nível das espécies. Assim, como representado na figura a seguir, dentro de um reino observaremos vários filos que, por sua vez, serão subdivididos em classes. Dentro delas há várias ordens que, assim, abrigam famílias e estas, gêneros, até que chegamos às espécies.
Linné ou Lineu, em português, também foi o responsável pelas primeiras regras de nomenclatura binominal. Estes critérios foram estabelecidos de forma a aumentar a capacidade de comunicação entre cientistas de diferentes partes do globo. Assim, era possível evitar que dois pesquisadores consumissem suas vidas com o mesmo organismo sem saber que havia outras descobertas no mesmo campo de estudo.
Para que tal mecanismo funcionasse, a primeira regra adotada era o batismo de cada grupo através do latim. Além disso, qualquer grupo que ocupasse posição entre o reino e o gênero deveria ter seu nome iniciado com letra maiúscula. Isso fazia com que a espécie fosse a única divisão a possuir duas palavras em seu nome, sendo formada pelo gênero em que estava localizada e um termo final, escrito com inicial minúscula, chamado epíteto específico. Logo, ao nos referirmos aos humanos, por exemplo, podemos dizer que fazem parte do reino Animalia, do filo Chordata, da classe Mamalia, da ordem Primate, da família Hominidae, do gênero Homo e, por fim, da espécie Homo sapiens.
Regras para se escrever o nome da espécie
• Latim
• Binominal
• Sublinhada ou itálico
• Primeira letra da primeira palavra em maiúsculo e o restante em minúsculo.
OBSERVAÇÃO
Para se escrever a subespécie, repete-se a regra da espécie, porém deve ser trinominal.
Exemplo: Homo sapiens sapiens
Regras para se escrever a família
• Em se tratando de animais a palavra deve terminar em IDAE
Exemplo: URSIDAE, CANIDAE, FELIDAE
• Em se tratando de vegetais deve terminar em ACEAE
Exemplo: BROMELIACEAE, ACACTACEAE
OBSERVAÇÃO
Repare que todos os termos taxonômicos, por se apresentarem em latim, precisam ser destacados no texto. De forma manuscrita, por exemplo, é comum que se sublinhe cada uma destas palavras, em especial, a espécie.
Uma classificação alternativa e mais moderna aquela proposta por Lineu divide a nossa biodiversidade em domínios, ao invés de utilizar reinos. O domínio Eucarya inclui todos os organismos eucariontes, anteriormente classificados nos reinos Protoctista, Fungi, Plantae e Animalia. O domínio Eubacteria inclui boa parte dos procariontes anteriormente classificados como bactérias, incluindo aquelas causadoras de doenças em humanos e que são poucos tolerantes a grandes extremos ambientais. Por fim, o domínio Archea inclui a parcela de procariontes anteriormente classificados como arqueobactérias, tipicamente estudados quanto à resistência a situações extremas (temperatura, salinidade, pH, etc) e que hoje são conhecidamente colonizadores de todo e qualquer tipo de ambiente.
OBSERVAÇÃO
Por mais que os membros do domínio Archea pareçam mais distantes daqueles presentes no domínio Eucarya dada a presença de muitos organismos extremófilos, dados moleculares demonstram que estes domínios foram grupos irmãos bastante aparentados. Assim, o domínio menos evolutivamente próximo ao nosso passa a ser o Eubacteria.
VÍRUS
Ao classificarmos todos os organismos vivos, algumas entidades biológicas fogem a qualquer um destes grupos, como os vírus. Assim, ainda que alguns cientistas acreditem que tais organismos deveriam participar do agrupamento originalmente feito por Lineu por apresentarem código genético e capacidade de reprodução, a maioria os coloca à parte e isto ocorre porque os vírus não apresentam uma composição celular. Sem membrana citoplasmática, ribossomos e metabolismo próprio, estas partículas virais se tornam completamente dependentes das células que parasitam, sendo, por isso, chamados de parasitas intracelulares obrigatórios.
Existem muitas famílias de vírus e cada uma delas possui seus diferenciais que facilitam a atividade parasitária, mas, de uma forma ou de outra, algumas estruturas básicas devem estar presentes. O material genético, por exemplo, é indispensável, e pode ser composto por uma molécula de DNA ou RNA. Nele estão contidas as informações que serão utilizadas durante a síntese de novas partículas virais. Além disso, o genoma viral deve ser delimitado por um capsídeo proteico que, de acordo com a sua arquitetura, pode possibilitar a visualização de regiões distintas como a cabeça, o colar e a cauda.
OBSERVAÇÃO
Alguns vírus apresentam uma estrutura membranosa externa ao capsídeo. Tal membrana não se qualifica como a membrana citoplasmática por não ser capaz de desempenhar as funções comuns a um ser vivo.
CICLO REPRODUTIVO VIRAL
Ao infectar uma célula, um vírus pode adotar duas estratégias que, em geral, são complementares. Seu material genético, uma vez inserido no citoplasma celular, pode se unir ao genoma do hospedeiro e permanecer latente. Assim, toda vez que a célula vier a se dividir, além de duplicar o seu próprio DNA, ela também o fará com o DNA viral. Esta fase, chamada de ciclo lisogênico, permite que o vírus se espalhe por várias células sem ter formado sequer uma nova partícula viral envolta em capsídeo.
No entanto, o ciclo lisogênico pode ser interrompido, tendo início o ciclo lítico. Neste, o genoma viral é duplicado de forma independente ao do hospedeiro. Neste ciclo há a possibilidade de usar a informação genética para a síntese de proteínas do capsídeo que darão origem a diversos envoltórios, capazes de compor diversas novas partículas virais. Por fim, depois de terem sido montados muitos novos vírus, a célula hospedeira tem sua membrana plasmática rompida (lise celular) e este evento libera, no ambiente, vírus prontos para realizarem novas infecções.
VIROSES
Muitas são as doenças causadas por infecções virais. Assim, ainda que muitos dos sintomas sejam similares entre elas, algumas particularidades devem ser notadas, como apresentado nas tabelas a seguir.
CARACTERÍSTICAS GERAIS DAS BACTÉRIAS
Os primeiros organismos vivos que estudaremos são agrupados no reino Monera. Estes procariontes, sem núcleo definido ou qualquer estrutura membranosa interna, podem ser autotróficos – no caso das cianobactérias – ou heterotróficos – no caso das demais bactérias. De forma geral, suas células são constituídas por uma membrana citoplasmática que delimita o citoplasma, no qual se encontram ribossomos procariontes (70S), um único cromossomo circular e plasmídeos. Assim, enquanto as características básicas de uma determinada espécie são determinadas pelo material genético contido no cromossomo (localizado em uma região conhecida como nucleóide), os demais aspectos de um indivíduo (resistência a antibióticos ou aderência, por exemplo) são conferidos por estes pequenos anéis de DNA chamados plasmídeos, que podem ser transferidos de uma bactéria a outra.
Externamente à membrana plasmática se encontram a parede celular constituída majoritariamente por substâncias conhecidas como peptidoglicanos e, em alguns casos, uma cápsula formada por carboidratos ou proteínas. Assim, além das funções de controle exercidas pela membrana, a bactéria conta com um revestimento estrutural de proteção, tanto contra choques mecânicos quanto à desidratação. Vale ressaltar, ainda, que a parede celular e a cápsula não possuem qualquer controle sobre a entrada e saída de substâncias na célula bacteriana, sendo permeáveis a praticamente qualquer molécula.
Outras estruturas, oriundas dos envoltórios bacterianos, podem estar presentes. Assim, flagelos e cílios por vezes são visíveis ao microscópio, desempenhando função de movimentação. Já com relação à troca de material genético e fixação ao substrato, muitos indivíduos possuem em sua constituição as fímbrias ou pili, também formadas pela membrana plasmática.
Os mesossomos são dobras na membrana plasmática de bactérias que fazem respiração celular aeróbia, é nessa estrutura que a cadeia transportadora de elétrons ocorre.
CLASSIFICAÇÃO DAS BACTÉRIAS
Os agrupamentos realizados dentro do reino Monera podem levar em consideração diversas características, como formato e organização molecular. Assim, além dos nomes pertinentes às espécies, é comum o emprego da nomenclatura morfológica, onde se distinguem cocos, bacilos, vibriões e espirilos.
Por outro lado, a terminologia baseada na complexidade da parede celular também é bastante utilizada, principalmente devido à sua relevância clínica. Esta distinção, desenvolvida em 1884 por Hans Christian Gram, separa as bactérias em dois grupos. De um lado são encontradas espécies com parede celular mais espessa e rígida que, ainda assim, apresenta menor complexidade. Durante o método de coloração para visualização ao microscópio, tais organismos permanecem corados de roxo, sendo chamados Gram positivos.
As bactérias Gram negativas, que terminam o processo coradas em tons rosáceos, possuem maior complexidade em sua parede celular. Assim, apesar de possuírem menores quantidades de peptidoglicanos, o que torna a parede mais delgada; externamente a essa camada há uma membrana externa que serve como barreira seletiva à passagem de algumas substâncias.
A figura a seguir demonstra, resumidamente, as etapas envolvidas no processo de coloração pelo método de Gram. Assim, através da adição de diferentes reagentes, são separadas as bactérias mais virulentas (Gram negativas) daquelas que apresentam maior capacidade de fixação (Gram positivas).
REPRODUÇÃO BACTERIANA
Apenas uma modalidade de reprodução é distinguível nos organismos pertencentes a esse grupo. A forma assexuada, conhecida como divisão binária ou cissiparidade, envolve um único indivíduo que, através da duplicação de seu cromossomo, possibilita a ocorrência de uma divisão celular que originará duas células geneticamente idênticas. Neste processo, ainda que não haja adição à variabilidade genética de uma população, garante-se o seu rápido aumento numérico através de um processo de crescimento exponencial.
Existe, ainda, outro processo relacionado ao metabolismo bacteriano que é capaz de ampliar a diversidade genética da população de organismos. Neste caso, porém, não o classificamos como um método de reprodução, uma vez que não são formados novos indivíduos. Assim, três são as possibilidades que envolvem a troca de DNA entre duas bactérias: transformação, transdução e conjugação.
Em algumas situações, a morte de bactérias gera a liberação de plasmídeos no meio onde se encontra uma determinada população. Estas moléculas de DNA, então, tornam-se disponíveis aos organismos ainda vivos e a sua captura faz com que estes adquiram novas características, falando-se assim em uma transformação bacteriana.
Em outra situação, um vírus (bacteriófago), ao infectar uma bactéria pode trazer consigo um fragmento de DNA que seja transportado consigo até outro indivíduo. Neste processo de transdução, o agente viral é o responsável pela combinação do material genético de duas bactérias.
Por fim, no processo de conjugação, uma bactéria replica parte de seu material genético e o transmite a outra. A passagem do DNA de um procarionte a outro depende da formação de uma ponte citoplasmática (pili) que conecta o citoplasma destes dois organismos.
RESPIRAÇÃO BACTERIANA
• Aeróbia estrita – só sobrevivem na presença de oxigênio.
• Anaeróbia estrita – só sobrevive na ausência de oxigênio.
• Anaeróbia facultativa – na ausência do oxigênio, realiza respiração anaeróbia.
PRINCIPAIS BACTERIOSE
Muitas doenças comuns apresentam como agente patogênico (causador) as bactérias. Estas podem ser transmitidas por diversas vias como, a água, o ar, alimentos e relações sexuais sem proteção. Assim, a tabela a seguir apresenta as principais bacterioses, seus agentes causadores e particularidades.
BIODIVERSIDADE DO REINO PROTOCTISTA
O reino Protoctista (antigamente conhecido como Protista) inclui protozoários e algas. Enquanto os primeiros são exclusivamente unicelulares e heterotróficos; os segundos podem ser unicelulares ou pluricelulares, apresentando como principal forma de nutrição a fotossíntese. Tal variedade taxonômica é apontada em estudos recentes como uma falha de classificação, fazendo com que este reino seja considerado um grupo artificial (parafilético). Ou seja, os organismos que estudaremos neste módulo, por mais que venham a ser considerados como pertencentes ao mesmo táxon, não são, na realidade, evolutivamente próximos.
CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS PROTOZOÁRIOS
Os protozoários são eucariontes que podem ser de vida livre – habitando a água e o solo – parasitas ou mesmo se estabelecerem como seres mutualísticos em relações benéficas a outros organismos como cupins e ruminantes. De forma geral, são heterotróficos e obtém seus nutrientes a partir do meio ambiente em que vivem, ainda que isto signifique a captura de alimento a partir das células hospedeiras que infectam.
PRINCIPAIS GRUPOS DE PROTOZOÁRIOS
A classificação dos protozoários se baseia na presença ou ausência de estruturas locomotoras. Assim, os sarcodíneos (ex.: amebas) englobam aqueles seres que dependem da formação de pseudópodes (prolongamentos temporários da membrana plasmática) para a movimentação, enquanto os cilióforos (ex.: paramécios) e os mastigóforos (ex.: tripanossomas) apresentam estruturas fixas, sendo os cílios presentes nos primeiros e flagelos nos últimos.
Há ainda seres que não apresentam quaisquer especializações voltadas ao seu deslocamento. Neste caso falamos em esporozoários (ex.: plasmódios) e a sua locomoção depende, em geral, de vetores animais ou do transporte realizado pela água.
REPRODUÇÃO DOS PROTOZOÁRIOS
A reprodução é geralmente assexuada, mas há organismos capazes de realizar a troca de material genético ou mesmo a produção de gametas. Neste último caso, a variabilidade genética da população aumenta o que dificulta a eliminação de uma espécie por uma determinada alteração ambiental.
RELEVÂNCIA MÉDICA DOS PROTOZOÁRIOS
Muitas doenças negligenciadas pelos grandes centros de pesquisa e tratamento são causadas pela infecção por protozoários. Tal contato pode ocorrer pela ingestão de alimentos ou água contaminados e pela exposição a um vetor, como um mosquito transmissor.
A Doença de Chagas, por exemplo, é causada pelo Trypanosoma cruzi quando este é transmitido através de seu vetor, um percevejo popularmente conhecido como barbeiro (Triatoma infestans). Este animal de hábitos noturnos se alimenta de sangue e costuma buscar esconderijo em aberturas de árvores ou rochas. Quando o humano constrói sua residência em locais próximos à mata, em geral, destruindo-a, aproxima-se e se expõem a este vetor. Assim, durante a picada do percevejo, ocorre a eliminação dos protozoários através de suas fezes que ficam em contato com a pele humana. Como tal situação costuma provocar coceiras, o próprio humano acaba abrindo pequenas feridas que permitem a entrada do tripanossoma e sua disseminação pelo sangue, como mostra a figura a seguir.
Para eliminar a doença é necessário combater o vetor através do uso de inseticidas e da substituição de casas de pau-a-pique – construídas com barro e escoras de madeira – por construções de alvenaria. Outra medida, esta mais comum, reside na fiscalização de bancos de sangue para que transfusões não sejam as responsáveis pela contaminação de indivíduos saudáveis.
Outra protozoose relevante é a malária, causada pelo esporozoário do gênero Plasmodium sp. Estes parasitas são transmitidos ao ser humano através da picada de um vetor, o mosquito anófeles ou prego e, se disseminando através do sangue, atingem o fígado e o baço onde se transformam e assumem uma forma capaz de infectar as hemácias (glóbulos vermelhos do sangue). A proliferação dos plasmódios no interior das hemácias causa a ruptura destas células e consequente liberação das toxinas produzidas pelo parasita que, até então, se encontravam ali armazenadas. Como este fenômeno ocorre de maneira generalizada, a grande quantidade de toxina provoca quadros de febre a cada 48 horas – febres terçãs – ou 72 horas – febres quartãs – variando de acordo com a espécie de plasmódio causadora da doença.
O tratamento é feito com medicamentos e os insetos adultos podem ser combatidos com inseticidas ou, ao menos contidos, através de mosquiteiros e telas. As formas larvais do anofelino devem ser evitadas através da eliminação de objetos que possam acumular água parada, da drenagem de regiões alagadas, pelo uso de larvicidas ou através da criação de peixes que se alimentem delas.
Além destas, merecem destaque a Leishmaniose tegumentar (úlcera de Bauru) causada pela Leishmania braziliensis, a Leishmaniose visceral (calazar) causada pela L. donavani ou L. chagasi, a giardíase causada pela Giardia lamblia e a toxoplasmose causada pelo Toxoplasma gondii.